18 janeiro, 2010

Conversa de loja de conveniência

Dois rapazes na fila do caixa, esperando atendimento.
A ansiosidade fala por si, e a inquietude se expressa nas palavras:
- Que demora heim! Esbraveja o cliente.
- É mesmo, está demorando muito. Completa o próximo da fila.
- Eu nunca gostei do atendimento dessa loja. Imenda.
- Nem eu, só venho aqui porque não tem nenhum outro mercado por perto. Conclui.
- Pera aí meu. Da onde você é, to sentindo algo estanho no seu sotaque. Pergunta o rapaz que está por último.
- Sou da lituania. Responde com naturalidade.
- Caramba!!! Nunca pensei que conheceria alguem da lituania! Que interessante. E a quanto tempo você está por aqui?
- Já faz um tempinho heim. Acho que mais que 10 anos.
- Putz, 10 anos !? Isso é uma vida!! Quantos anos você tem?
- Estou com 32.
- 32? Isso quer dizer que você viveu o fim da União Soviética, né ?? Pergunta com empolgação.
- Vivi sim. Responde friamente.
- Mas me conta!! E aí ??
- E aí o que ?
- Como assim e aí o que?? Me fala o que você sente com isso! O fim da URSS não significou nada para vc? Ou para a sua família? Ou mesmo para o país?
- Bom, significou sim. Mudou um pouco, mas tá quase a mesma coisa.

Nisso, a fila anda. E depois de atendido o rapaz da lituania vira e se despede.
- Mas pera um pouco aí. Pede o outro. Quero saber mais uma coisa.
- Blz. Mas rapidinho blz ? Tenho q tomar o meu rumo.
- Blz, rapindinho! concorda o inquisitor.
Depois de ser servido ele continua o inquerito. Aponta a direção para irem caminhando e retoma o assunto:
- Então, mas me fala, vc era adolecente quando tudo aconteceu, né ?
- Sim, era adolecente.
- Já trabalhava?
- Não.
- E como era na escola? As aulas de geografia e história mudaram do dia para a noite?
- Não.
- Não ?Estarrecido continuou. Mas quando acabou a URSS não mudou tudo?
- Mudou, mas as mudanças são gradativas. Fomos sentindo com o tempo. Ou melhor, foi uma mudança tão tranquila que mal sentimos. O que foi mais sensivel foi o fim das cotas para comida, cigarros e etc. Além do fim das filas para pegar as cotas.
- Tinha fila pra pegar as cotas é?
- Sim, tinha muita fila. Toda semana era a mesma história. Alguem da família ia lá e demorava um bocado. Mas pegava tudo de uma vez. Açucar, sal, pão, cigarro, bebidas e etc.
- E tinha que pagar para pegar isso ou era só mostrar um documento ?
- Tinha que pagar.
- Putz, sério? Perplexo.
- Sério! Mas não para tudo. A maioria das coisas a gente pegava mostrando um carnê.
- Como assim?
- Alguns itens eram disponibilizados através de um carnê diário. Outros itens tinha que pagar para pegar. Mas esses são os extras.
- Extras? Desiludido.
- Sim, o que era vendido no mercado negro. O que não era disponivel através das cotas semanais e mensais. O que era excesso de limite.
- Hummm, entendo. E o mercado de trabalho, mudou ?
- Mudou.
- Muito? perguntou o inquisitor.
- Razoavelmente.
- Como assim, razoavelmente?
- Nada mudou de repente. Foi passo a passo. As empresas não entraram com tudo de uma hora para outra. Foi gradual. Mesmo assim, você não pode comparar aqui com a Lituania. Continuamos muito diferentes. E falo isso em vários aspectos.
- Sim sim, imagino. Mas e sua família, mudou de emprego? O que seu pai fazia antes e o que ele faz hoje?
-Meu pai morreu. Respondeu com seriedade
- ..........
- Olha, eu tenho que ir.
- Lógico! Vai lá. Foi mal ter prendido vc aqui.
- Até mais.
- Até.

3 comentários:

moveiga disse...

Leo vc eh demais pra minha mente rsrsrsrs otimo texto!

Kbça disse...

da hora o diálogo mano.... bem escrito.... mas não precisa puxar o saco né mônica !!!!!... rsrsrrsrs

moveiga disse...

faz parte do meu papel...rsrsrrs