18 março, 2008

Justiça e injustiça individuais em um mundo de possibilidades

Ontem terminei de ler o livro FELIZ ANO VELHO (sobre o livro:http://pt.wikipedia.org/wiki/Feliz_Ano_Velho), do escritor MARCELO RUBENS PAIVA (sobre o autor:http://pt.wikipedia.org/wiki/Marcelo_Rubens_Paiva). É um livro impactante e muito bem escrito, em que o autor conta a própria trajetória de vida, na qual ele fratura a quinta vértebra da coluna, ao tentar pular para um rio deu uma alta pedra, e acaba por ficar tetraplégico.

O autor conta no livro como foi seu processo de readaptação a vida cotidiana, revelando os fantasmas que ficaram dos antigos hábitos e quais as novas perspectivas que ele deve enfrentar agora em que ele não caminha mais com as próprias pernas e dificilmente buscará os mesmos sonhos que um dia teve. Relembra o mundo acadêmico no qual vivia, cercado de novas aventuras e diversas experiências que fizeram com que ele se tornasse um jovem cheio de possibilidades e com um futuro vasto e amplo pela frente.

O livro é recheado de histórias engraçados e trágicas nas quais o autor vai pausadamente expressando suas idéias e conflitos internos que se manifestam principalmente a partir do momento em que acontece o acidente e o autor fica tetraplégico.

Um grande conflito interno vivido pelo autor é o próprio questionamento sobre o acidente. o autor se pergunta durante todo o livro porque ele foi escolhido para sofrer essa perda dos movimentos dos membros, fazendo com que o leitor também entre nessa lógica de questionamentos, se perguntando sobre o momento em que vive, porque lê aquele livro e porque vive a vida que vive.

FELIZ ANO VELHO é um grande motivador de reflexão. Mas esse estágio de reflexão só chegará se o leitor se permitir comprar a idéia do autor. A proposta é desenvolver a reflexão sobre nossos atos com a tentativa de chegar ao âmago de nossas ações.

Aí vai um trecho do livro, espero que esse trecho motive todos a ler a obra de MARCELO RUBENS PAIVA. Selecionei um trecho que faz parte das reflexões do autor um ano depois de seu acidente, momento em que ele vai se encontrando em seu novo papel social e começa a adquirir uma perspectiva diferente sobre a vida. Contextualizado as idéias de MARCELO RUBENS PAIVA logo depois do trecho coloco uma tira do Calvin, se perguntando sobre justiça e injustiça nesse mundo de pontos de vista e de acontecimentos voluntários e involuntários.



FELIZ ANO VELHO - MARCELO RUBENS PAIVA


Dia 14 faço um ano de acidente, e só agora realmente vou começar o tratamento de fisioterapia. Foram dez meses de vértebra em frangalhos, usando aquele colete de ferro, e mais um mês de espera pela vaga. Um ano em que tive um certeza: minha vida mudou pacas. Sou um outro Marcelo, não mais Paiva, e sim Rodas. Não mais violinista, e sim deficiente físico. Ganhei algumas cicatrizes pelo corpo, fiquei mais magro e agora uso barba. Não fumo mais Minister, agora passei pro Luis XVI. Meu futuro é uma quantidade infinita de incertezas. Não sei como vou estar fisicamente, não sei como irei ganhar a vida e não estou a fim de passar nenhuma lição. Não quero que as pessoas me encarem como um rapaz que apesar de tudo transmite muita força. Não sou modelo pra nada. Não sou herói, sou apenas vítima do destino, dentre milhões de destinos que nós não escolhemos. Aconteceu comigo. Injustamente, mas aconteceu. É foda, mas que jeito...



Muito tempo depois, soube que estivera mais morto do que vivo naquela UTI. Minha mãe conta que, logo após chegar de Campinas, perguntou pro médico o que ela poderia fazer, e ele disse:

- Nada, apenas reze.



Hoje em dia, me pergunto se preferiria estar morto. Não sei, nem quero saber. Só sei que, nas noites em que tenho insônia, lembro de um garoto normal que subiu numa pedra e gritou:

- Aí, Gregor, vou descobrir o tesouro que você escondeu aqui embaixo, seu milionário disfarçado.


Pulou com a pose do Tio Patinhas, bateu a cabeça no chão e foi aí que ouviu a melodia: BIIIIIIIIIIIIIIIN.

Estava debaixo d´água. Não mexia os braços nem as pernas. Via somente a água barrenta e ouvia: BIIIIIIIIIIIIIN.





Um comentário:

Anônimo disse...

Ai Leo publiquei aquele conto do pescador no blog Literatura periferica, gerou ate um comentário, clica lá pra ver
Eu dei um nome:
"CADA QUAL NA SUA PRAIA"
www.literaturaperiferica.blogger.com.br

Michel